domingo, 6 de outubro de 2013

A PARTICIPAÇÃO DA NATUREZA DIVINA FAZ-NOS SOBRENATURALMENTE SEMELHANTES  A ELA


(continuação de trechos do livro de  Matthias Joseph Scheeben :retiradas  do seu magnífico livro intitulado                                                          "As Maravilhas da Graça Divina")




       Vejamos agora , com mais precisão, como se produz esta participação da natureza divina.
       
       Segundo afirmam os teólogos, observamos em todos os seres uma participação da natureza divina. Todos assemelham-se a Deus, mais ou menos, em sua vida, em suas forças, ou em sua atividade, e manifestam a glória divina. Do mesmo modo que o Apóstolo, podemos também nós contemplar a glória invisível de Deus nas coisas criadas. Mas estas semelhanças são extremamente diversificadas. Os seres materiais apresentam-nos tão somente uma ténue expressão da glória de Deus; os vestígios deixados após si, poderíamos compará-los ao rasto marcado pelo pé do homem na terra mole. Este rasto acusa o pé de um homem; não passa de uma imagem de seu pé e não reflete a natureza do homem. Deus é espírito; os seres materiais, como obra das suas mãos, glorificam-no, proclamam sua sabedoria e poder; não lhe representam, porém, a natureza. Pelo contrário, nossa alma e os espíritos puros contém já uma certa imagem da natureza divina, como espirituais, racionais e livres. Estas naturezas são contudo finitas, tiradas do nada, de uma espécie totalmente distinta  da natureza divina. São como que a imagem de um homem  reproduzida na tela por um artista; tal imagem não nos mostra a feição, os gestos, a cor da pessoa representada ... Assim a natureza racional se torna inteiramente semelhante à divindade, quando se converte em espelho imaculado, refletindo-a  em toda a sua beleza. Penetrada e glorificada pelo ardor divino, fica como transformada em Deus, tal um cristal concentrando os raios solares, ou o parélio, imagem do sol.
        
       Quando dizemos participar nossa alma da natureza divina, afirmamos receber ela a condição própria de Deus; de tal forma se torna semelhante a seu criador que pode dizer-se, com os Padres, estar ela verdadeiramente divinizada. Escreve S. Dionísio: "A divinização é a assimilação e a união mais intima possível com Deus" (Eccles. Hier, c. 1, 2). O mesmo ensina-nos S. Basílio: "O Espírito Santo é fonte de  um gozo sem fim que consiste na assimilação de Deus. Converte-se em Deus! Nada se pode desejar de mais belo". Não se trata, pois, de uma indentificação de nossa substancia com a substancia divina nem de uma união pessoal, hipostática, como a de Cristo, e, sim, de uma transfiguração de nossa substancia na imagem da natureza divina. Para ele não nos convertemos, portanto, em novos deuses, distintos do verdadeiro Deus, conseguintemente em falsos deuses. O que Deus é por natureza, tornamo-nós pela graça: somos uma imagem sobrenatural, um reflexo  da glória própria de Deus.
        
       Para formamos uma ideia mais completa desta semelhança com Deus importa percorrer uma a uma as propriedades que distinguem a natureza divina das naturezas criadas.

       Antes de tudo, consideremos a essência divina. Sómente Deus tem em si a existência, existência eterna e imutável; de ninguém depende ele. Por si só, as criaturas confundem-se com o nada; existem unicamente porque a Deus aprouve conceder-lhes a existência, porque as criou do nada. Eu sou o que sou, disse o Senhor, e todos os povos, em minha presença, são como se não existissem, não passam de pó e vaidade. Todas as criaturas, inclusive os espíritos imortais, deixariam de existir, se a mão de Deus não os sustentasse.

       Segundo o ensinamento do Apóstolo, a graça é uma nova criação, a fundação de um reino novo e indestrutível. Graças ao poder de Deus que tudo criou, somos adolados no seio do Padre eterno, ao lado do Verbo igualmente eterno. Somos chamados a participar de uma vida que ultrapassa os limites do tempo, de uma vida eterna. Descansamos sob a tenda da eternidade divina, junto à fonte de todo ser e de toda vida. Nossa existência eterna está tão assegurada como se fôramos Deus em pessoa. Podem perecer céu e terra, cair os astros do firmamento, desconjuntar-se a terra de seus fundamentos - não importa, nada disto nos atingirá, visto repousarmos acima de todas as criaturas, no seio do Criador.

      (continua...) 

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